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Bonequinha de Lixo do Luxo do Carnaval

¿holaquetal?


cê sabe qual o principal job de quem trabalha em uma agência de publicidade?

R: tentar tornar o ambiente de trabalho um pouco menos lamentável.

os recursos incluem os mais atuais vídeos memes, happy hours infindáveis e todo esse tipo de entorpecimento. 


grazadeus, minhas vivências foram mais singelas.


em 2013 eu estagiava numa agência digital, a menos pior em que trabalhei - importante reconhecer - mas que não me poupou da crise com a vida publicitária. no período de um ano tive 3 períodos críticos de inflamación na garganta (meu corpo dando sinais da nítida insalubridade da minha vida) e em um dos dias em que eu me recuperava aos trancos&barrancos, rolou mais um dia-tentativa da nossa existência ali ter un poquito más de significado: uma sexta temática de Halloween.

com 0 energia pra elaborar muito, recorri ao clichê “Bonequinha de Luxo” e, como eu tinha que terceirizar ao máximo a minha vida, com a composição da fantasia não foi diferente: mamacita comprou no centro de Osasco uma coroinha, piteira e luvas pretas (que seguem sendo minhas luvas de inverno, juro). somei com os óculos, pérolas fake e o vestido que eu já tinha e voilá, eis uma Holly Golightly escondendo uma grande dor (de garganta e existencial):

a fantasia ainda me acompanhou em uma festa de faculdade (quando era tarde demais pra perceber que usar um banheiro de balada universitária com luvas E ANÉIS não era tão cool).



e no ano em que criei a Caótica Suave, em 2017, brinquei de fazer uma sessão de fotos comigo mesma, pra matar as sdds :)




no finalzin de 2019, em mais um momento de trocadalhos inúteis com meu namorado (afinal, passamos pela faculdade de comunicación juntos) algo que soava útil surgiu: Bonequinha de Lixo.


boba que soy, amei a ideia, que se juntou na lista de ideias em meu Trello, com potencial pra ficarem lá pra eternidade. queria usar dessa personagem pra uma função didática sobre os resíduos, mas o receio da ideia ser recebida como algo pejorativo e até arrogante era maior que a empolgación.

eis que chega 2020 e com ele: el carnavrau. a época ideal pra se passar qualquer mensagem séria, pero com um tom de kkkk. é um cenário em que as pessoas ficam mais amaciadas (pela cerveja?) pras ideias loucas e, caso alguém julgue ofensivo, você pode usar the famous recurso do “foi mal, tava doidão” e bloco que segue. então lá fui yo.


Qual foi a última vez que você fez algo pela primeira vez?

eu: levar saco de lixo na bagagem de mão e ainda usar o look na viagem.


como passei o carnaval em BH, levei na malinha dois sacos de lixo de seiláquantoslitros e acessórios quase de uma década atrás. bastaram dois desayunos mineiros com a galere e eu já tinha os demais insumos pra fantasia: conjunto de brincos de tampinha de alumínio by Yakult, colar de tampinhas de garrafas plásticas e pingentes de potinhos de Yakult e óculos com espátulas de sorvete gourmet. claro que dava pra ser melhor elaborado, mas fora do meu habitat acabou sendo meio na louca.


Mulher Se Fantasia De Bonequinha de Lixo No Carnaval e o Resultado Irá Chocar Belo Horizonte:

a verdade é que a chamada é sensacionalista-click-bait e no bloco muita gente nem entendeu porque eu tava me sujeitando a suar sob o calor mineiro de fevereiro dentro daquele saco. mas os poucos que entenderam, soltaram o kkkrying que eu esperava, então suave.


agora que obtive a validação social em forma de likes, por mais que a mensagem embutida nessa fantasia pareça um tanto quanto óbvia (pra você que sabe que existe um filme chamado "Bonequinha de Luxo"), eu ainda acho importante mergulhar um tiquinho mais a fundo nessa reflexión.


lixoluxolixolixoluxolixoluxolixoluxolixoluxolixoluxolixo


o jogo de palavras luxo e lixo não é nenhuma novidade na nossa língua, tanto pela aproximação sonora, quanto por abrir infinitas interpretaciones. acho que aqui vale exaltar aquele poema concreto de Augusto de Campos, que vi pela primeira vez no ensino fundamental e fiquei QQQQ, chocated.

a maior interpretación que fica é: o lixo como produto do luxo.


o que chamamos de “lixo” (nem curto usar essa palavra, mas nesse post não vai ter jeito....) é resultado de todas extravagâncias&luxos humanos: da cápsula de café, cotonete, canudinho, embalagens individuais de snacks e as famosas frutas embaladas até o entulho resultante de reformas por puro luxo.

claro que existe o lixo hospitalar, por exemplo, e resíduos que surgem como produto de algo mais nobre, para administrar a saúde, acessibilidade e até garantir a vida. mas a gente bem sabe que essa é só uma fatiazinha desse grande bolo chamado sociedade do descarte. 


hablando em fatiazinha - e também pra eu não me perder nesse tema imenso que é a problemática de resíduos sólidos - vou seguir com um recorte do próprio evento/contexto em que a Bonequinha de Lixo estava inserida.


Carnaval é a festa que mais polui, simultaneamente, as ruas brasileiras, e nem precisa de dados pra confirmar esse fato (poupe-me dessa). as cidades sofrem mais ressaca que a galera que mistura Ousadia quente com Catuaba. cheiram a urina, se impregnam de glitter (ainda tô falando das ruas) e terminam o dia com as sarjetas cheias dos rastros de toda a extravagância dos excessos. 

esse é o lixo como produto do luxo, do luxo do entorpecimento como ferramenta pra fugir do vazio existencial.

esse é o lixo que vira também o pequeno luxo dos catadores. as pessoas na sarjeta da sociedade capitalista.


enquanto o “lixo” também pode ser matéria de protesto, produção artística (essa exposição sobre lixo eletrônico tem micorazón) e decorativa (conheça o trabalho magnífico da Sucata Quântica, nunca te pedi nada), os catadores usam desse descarte como recurso-chave de sobrevivência.


lembrando que não dá pra romantizar uma situação em que mais de 800 mil pessoas fazem de uma ação de interesse público&global, um emprego que sequer tem seu devido reconhecimento...

e não dá pra falar de Carnaval e (in)visibilidade dos catadores sem mencionar Mundano. esse artivista (como ele se auto intitula e eu afff amo) tá aí na atividade há 13 anos 


depois dessa mais de década desse trabalho (claro, somada a atenção tardia da grande mídia em apontar as problemáticas dos resíduos sólidos e campanhas paralelas como o Vá de Lata) pareeeece que a conscientização está se popularizando. (observei como até os próprios vendedores de bebidas sacaram o valor e a facilidade de se praticar a logística reversa e vendiam na mesma medida que recolhiam latinhas vazias, já estrategicamente preparados com carrinhos, como nesse momento que registrei e me senti bem documentarista). 


pra demonstrar esse movimento, acho que nada melhor que a visão e o trabalho do próprio Mundano, que nos coloca mais de pertinho com a realidade dos Catadores do Carnaval. segue aqui TOP 5 publicações dele, com essa temática, pra fazer refletir e nos inspirar na eficácia das pequenas-grandes ações.


TOPZERA 1

“Se juntássemos todos os catadores e catadoras de materiais recicláveis que estão trabalhando no Carnaval por todo o Brasil eles formariam sem dúvida o maior e mais importante dos Blocos. Eles vão, em sua maioria, minerando bauxita no meio da multidão de foliões. Se não fossem os catadores e catadoras teríamos ainda mais mineração predatória nesse país , visto que eles reduzem significativamente a demanda de minérios promovendo a economia circular. Por isso, neste carnaval , apoie, reconheça, agradeça e facilite o trabalho desses super heróis urbanos”



TOPZERA 2

"Nos últimos 3 anos me juntei ao #blocosdoscatadores pra protestar (foto) pela contratação desse que é um serviço público e privado e de interesse global. (...)

Se não tivéssemos o trabalho desses profissionais teríamos :

- mais bueiros entupidos (mais enchentes)

- mais embalagens no chão (mais foco de dengue)

- incontáveis toneladas de materiais recicláveis sendo enterradas como lixo (aumento de vida útil dos aterros sanitários)

-Desperdício de milhares de toneladas papel, alumínio , ferro, vidro (com catadores essas matérias primas finitas e cada dia mais escassas voltam ao ciclo)

-mais consumo de água , energia e geração de gás carbônico (a reciclagem poupa recursos naturais)

- o aumento dos gastos públicos com a limpeza das vias , transporte e etc (sim o governo economiza com catadores)

-O impacto das mudanças climáticas mais presente no nosso cotidiano (o trabalho dos catadores mitiga impactos do aquecimento global)

- menos renda pra centenas de milhares de pessoas (diminui a desigualdade social)

e muito mais. Portanto provoco vocês a reconhecerem, agradecerem facilitarem o trampo dos catadores. E, principalmente, somarem no coro para que em mais nenhum carnaval ou grande evento público e privado não aconteça sem os catadores incluídos . E não faça isso pelos catadores apenas, faça isso por você mesmo e todos que virão nesse planeta que está com os dias contados"


TOPZERA 3

acho que a imagem dispensa legendas...


TOPZERA 4

"Catadores e catadoras hoje receberam 340 pegadores de materiais recicláveis . Uma ferramenta simples e eficiente que faz com eles não sintam tantas dores do exercício repetitivo de abaixar pra pegar latinha no meio da multidão. Forçam muito as costas já que cada catador pode abaixar de 200 a 800 vezes num dia. E o pegador pegou em cheio os catadores que adoraram . Um benefício justo que vi e senti bem forte que até emocionei .

Por mais dias como esse, onde ocupamos e fortalecemos a rua e todas e todos que vivem nela!"

TOPZERA 5

"E a minha fantasia do carnaval vai ser todos os dias de coletor móvel “#sólatinha“. Uma fantasia funcional, feita com materiais de reuso, que armazenar as latinhas do consumo dos amigos e da galera que passa e não tem uma lixeira próxima . Assim, eu acumulo e entrego direto na mão dos catadores e catadoras . O melhor disso é evitar que eles abaixem ainda mais pra pegar as latinhas . Fiz uns cálculos e tem catadores que chegam a abaixar mais de 1000 num dia . E não há corpo que aguente . A ação funciona incrivelmente bem✨. E pra fazer ela basta uma plaquinha com uma mensagem amarrada e uma garrafa de plástico ou pote com furos em baixo . Resolvi postar pra quem sabe alguém se animar fazer uma fantasia útil e regada a sorrisos dos catadores e foliões por onde ela passa"

fiz toda essa amarração Bonequinha de Luxo + Lixo + Carnaval + Mundano como forma de inspiración não só pros Carnavais, mas para as pequenas-grandes atitudes cotidianas que vão além de um conhecimento técnico em reciclagem ou manejo de resíduos sólidos. é uma questão de empatia e humanidade.


e que todas essas idealizações, não fiquem só na fantasia.

eu acredito. bamos.

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